sexta-feira, 29 de novembro de 2013

Mitos e Ritos: Uma jornada feminina

 

PRIMEIRO CONGRESSO DE MULHERES DA CIDADE IMPERIAL


           

 

Palestra proferida no Palácio de Cristal -  Petrópolis em : 07/03/2004

 Autora: Vannda Santana

 E-mail: vannadsantana@hotmail.com

          


Toda mulher passa por uma jornada de ritos e mitos como personagem arquetípica, desafiando a ritualística na condição de filha, mãe, amiga, namorada, parceira ou amante ... Durante esses estágios pelos quais a mulher terá de passar, a vida lhe reservará múltiplas escaladas sem que tenha tempo para pensar. O nascimento de uma mulher é marcado por uma ironia do destino: junto com ela, encravada em sua predestinação, há uma caixinha de segredos que nada lhe revelam ou prometem, somente o tempo um dia poderá dizer. O que se pode afirmar no presente, no aqui e agora, aponta para o futuro; portanto é seguir em frente, seguir a trilha do longo caminhar, onde tudo é uma aventura renhida de fôlego que se soma no corpo ao lado de todo processo fisiológico: vaidades exacerbadas para umas e, para outras, o desmazelo, além de enxaquecas e TPMs. Algumas se veem como sendo a vida castigo, enquanto outras tiram a sorte grande de com tudo não se incomodar.

 

 Mas certo mesmo, toda mulher já sabe: terá no corpo uma marca que a acompanhará nesse percurso de existência humana e feminina desde a sua prematura idade (da adolescência), culminando com as irreversíveis mudanças da terceira idade; desde o viço da beleza, aos primeiros sinais da degenerescência.  Nada escapa ao tatuar do tempo e nem a faz desviar do que terá de enfrentar. Este é um longo percurso a que toda mulher terá de se predispor, sempre com uma carga a mais de prévia aprendizagem. Nada se retira ou se acrescenta da sua condição de aceitação. E, assim, uma vez sendo mulher, o caminho já está traçado. Aliás, isto é só mais um ato iniciático. Para início de conversa, o corpo é sábio e nele funciona um laboratório fantástico que se predestina por uma condição singular que acontece durante toda a existência da vida e com direitos a testes, prova de resistência, a de ser mãe, ensaios entre a submissão de ser mulher e amante, muito além da altivez de ser a provedora do lar. Mas em tudo isto há um sábio enfrentar a fim de vencer os próprios limites.

 

Esta  é a vida de qualquer mulher. Isto é o que lhe reserva o destino: num dado momento compartilhar aventuras e em outros instantes vivenciar os mais delirantes desejos. Mas em tudo há um traço pertinente marcando a trajetória da história feminina; seja pelas vitórias e realizações, ou pelas decepções e frustrações amorosas. O que se pode perceber, num caso ou no outro, registra-se no corpo como marca de existência humana capaz de driblar a má sorte e, com sorte, se o amor lhe bafejar, nada será obstáculo à condição de ser mulher.

 

Mas seja qual for a atribuição da mulher durante a sua existência será muito mais que mitos em seus rituais e, pouco a pouco marcará sua trajetória, ainda que inconscientemente. Basta haver uma necessidade, uma situação ameaçadora, um filho em perigo, para que reapareça e ressurja do nada uma força incrível, sem que se possa medir, tamanha será a reação de proteção. Podemos destacar essa força feminina e de igual potência, àquela existente nas fêmeas dos animais. E, desse modo, estarão sempre prontas para enfrentar o presente, adequando-se para o próximo instante até mesmo diante do imprevisível. E quando essas criaturas tem de entrar em cena, mesmo sem ter antes ensaiado seu script, não hesitarão em fazer do chão o seu palco e nem se abalarão por ter de passar pela corda bamba do picadeiro. Nesse momento são elas as ( mulheres) que se vestirão do arquétipo mais poderoso para dar conta de um espetáculo chamado vida: abrem-se as cortinas do agora  e desce o pano de fundo do enredo entre o sagrado e o profano; celebram cenas de alegria ou de tristeza, mas não calam as dobras do destino; vencem as bordas do tempo no fazer com arte a vida e, assim, como estrelas do amanhã, brilharão hoje, exaltando a existência humana, procurando equilibrarem-se na aventura da razão ou da des-razão.

 

 Vimos um pouco sobre os mitos personificados nas mulheres e vimos também aqueles mitos que nem sempre gostam de se fazer presentes. Mas aqui, através desta escrita, alguns desses mitos manifestam-se com suas estruturas dentro da escrita ou até por meio da imagem. Os Mitos são assim: estruturas singulares que vão designar certos tipos de comportamentos, além de caracterizar com sua presença marcante a fala e a atitude de um determinado povo, de qualquer lugar ou etnia. Entretanto, os símbolos associados aos mitos podem realçar sua presença através dos costumes, das crenças populares, ao mesmo tempo em que se mostram pelas características de rituais e de identidade os quais se manifestam em cada grupo.

 

 A imagem, tal como a escrita literária, também se veste de mitos e ritos, de símbolos e de magia uma vez inscritos. Podemos perceber suas ações através das lendas, fábulas, folclore ou ainda presentes nas literaturas clássica ou popular. Esses seres míticos podem surgir vivos nas  letras, nas canções, nas danças, nos oferecendo belas peripécias de linguagens e gestuais que se apresentam decodificadas em obras de artes bem como na poesia, nos romances, contos e crônicas, assim como nos contos de fadas. Dentro desse conjunto de obras artísticas, históricas e lendárias, encontram-se aquelas que não podem faltar e que são de conhecimento universal, por exemplo:  Bíblia  Sagrada, Cabala, Torah, Alcorão etc. Desse modo, constatamos que a mulher semelhante à literatura é o grande templo onde  residem todos os mistérios.

 

As mulheres se mostram como seres quase que absolutos diante de uma força interior, à qual não se pode medir, dela se vestem e são por ela incorporadas, deixando-a reinar em seus corpos com suas múltiplas  ações. As mulheres são assim: especiais. Parecem manter um pacto com os deuses brincalhões: ora são elas ninfas, ora são elas as fadas das histórias infantis. Em outros momentos, viram bruxas más também. Entretanto acredito, por ser também mulher, que todos deveriam aprender um pouco mais com essas “deidades”  o exercício de  suas   polaridades e de suas tamanhas ambivalências. Elas sabem de coisas das quais muitos ainda não apreenderam e, elas sabem muito mais: sabem doar afetos quase impossíveis e, sobretudo, todos os dias, sabem uma nova e rica lição de amor.