“Só esquecerei
de você e seus olhos, quando um pintor
pintar o som de uma lágrima caindo” (Chaplin).
O que dizer sobre o pensamento
de Chaplin, quando numa singeleza de imagem nos faz questionar a beleza que há
nesse devaneio. Subvertendo o pensamento racional e linear, o autor nos propõe a
poética da imaginação. Por isso, precisamos imaginar, necessitamos desejar para
viver devaneios saudáveis.
O que vem a ser o “vazio absoluto”? Como exemplificar o
sentido que está por trás deste par de palavras e como conceituá-lo em seu
campo semântico-emocional? Consultando as várias ciências, talvez devêssemos
pedir auxílio aos conceitos da Física por associá-lo ao éter, ao campo, ao
espaço e à energia. Entretanto, esses conceitos da ciência são limitados porque
só se validam no contexto particular ou atrelados a teoria em que são
mencionados. Por outro lado, a linguagem embrenha-se em territórios
epistêmicos, singularizando sentidos que não são específicos. Contudo, o que se
deseja buscar, fala de um conceito humanamente maior que defina o estado da
emoção contido na raiz do vocábulo ( no momento em que se escreve), aquilo que
se sente e não se tem uma explicação plausível à frase “vazio absoluto”.
Vimos que teremos de recorrer à
psicanálise, a fim de encontrar respaldo para um termo que possa adequar
sentido mais específico à expressão. Lacan aponta para o termo “Hiância” –
expressão que se refere ao “vazio”, vazio que há entre os parênteses, quando não
se escreve nada dentro deles: “vazio margeado”, “relativizado pelas bordas”. [Por Extensão]A
expressão se dirige ao “vazio” aparentemente subentendido pela linguagem e
submetido a uma posse que se refere a um vazio absoluto. Assim, a palavra “absoluto”,
em sua comunhão no par “vazio absoluto”, representa para nós (o DAS DING freudiano,
literalmente – A COISA), aquilo que não é nomeável e anterior a linguagem, portanto,
expressão meramente de suposição conceitual). Desse modo, também não há nenhuma
aproximação com a palavra KAOS, (referência grega), a não ser que se tenha a
intenção de (nomear) dar sentido: no
principio era o KAOS, no princípio era “A COISA” – um pouco forçado, porém,
pode ser uma alusão aproximativa para justificar o termo em questão.
Assim, a palavra
HIÂNCIA pode ser definida por um intervalo de vazio significante onde
"habita", na gnosiologia lacaniana, a FANTASIA, que é a relação do
Sujeito com o Objeto. Esse processo, explicitado por Lacan, ocorre sobre o
fundo da HIÂNCIA, entre (between) o significado e o significante onde o Sujeito
se vê refletido no vazio de seu desejo por sua ausência significante, pelo
qual, ele é pura busca de significação.
Impossível não invocar
Aragon pela via de Lacan em Le Fou d"Elsa numa passagem do Seminário XI, onde
o poema nos revela “o olhar vazio”, uma “cegueira”. Segundo Lacan, em seu
pensamento essencialmente aguçado e sensível, a fantasia seria a matriz psíquica que dá sustentação aos nossos
desejos. Com tantos conceitos concebidos, acredito que será bem apropriado
ilustrar a hiância através do referido poema que nos remete para o “olhar
escópico”, o olhar psicanalítico, por isso, significante. Assim, o texto em
questão, atrela-se ao “vazio” como significante
pela ausência do ver e do sentir, pelo
desejo, tal como no poema de Aragon, que também se repete pelo “vazio” entre o
olho e o olhar.
É em vão que tua imagem chega ao
meu encontro
E não me entra onde estou, que
mostra-a apenas
Voltando-te para mim só poderias
achar
Na parede do meu olhar tua sombra
sonhada
Eu sou esse infeliz comparável
aos espelhos
Que podem refletir mas que não
podem ver
Como eles meu olho é vazio e como
eles habitado
Pela ausência de ti que faz sua
cegueira[2]
Poderia
ainda trazer à tona Merleau-Ponty, quando diz “(...) que suas próprias palavras
não encerram o que dizem, que seu sentido transborda a significação imediata ou
direta e que, enfim, o poder de se abrirem para o ser está ligado à força da
interrogação que as anima.”[3]
Termino
este texto sem avançar no que pretendia exercer com maior clareza: falar do
“vazio absoluto” de forma simples, mas que pudesse despertar o desejo de
imaginar. Desse modo, sem ter o propósito de inserir campos complexos ao explorar os
sentidos do par de palavras que deu origem a esta escrita – vazio absoluto – restou em mim a
certeza de que aqui deixo expresso o desejo de continuar meu devaneio ao
imaginar.