Leitura do livro: O
Retorno do Pêndulo – Sobre a psicanálise e o Futuro do Mundo Líquido.
Autores:
Zygmunt Bauman e Gustavo Dessal
Leitura
reflexiva: Vannda Santana
Revisão:
Marcia Vital
O livro em questão é resultante de um trabalho intelectual
feito por dois escritores: um sociólogo e o outro psicanalista. A obra se
desenvolve a partir de um diálogo apaixonante entre os dois intelectuais. A
temática desse intercâmbio alude a um retorno à obra de Sigmund Freud O Mal
Estar na Civilização em que Bauman se apoia para dar relevo à
correspondência criteriosa exercida entre os dois autores: Zygmunt Bauman e
Gustavo Dessal.
Esses escritos formam o escopo do livro O Retorno do Pêndulo e através de quatro ensaios agrupam-se as
devidas respostas. Assim, podemos antecipar que o discurso discorre sobre a
psicanálise e a sociologia como instrumentos para a compreensão dos conflitos
familiares e sociais do mundo em que vivemos, aliando eficácia e pertinência que
oscilam entre o desejo de se conquistar
mais liberdade e o anseio de segurança.
As questões abrangem o conceito
de liquidez e o legado de Freud, tendo como ponto de partida a inversão de
valores e suas consequências no mundo contemporâneo rumo ao futuro, e
transcorre nesse deslocamento pendular apontando o célebre livro de Sigmund
Freud: O Mal-Estar na Civilização
publicado no período de 1929.
A chave principal para tratar dos aspectos como segurança e
ausência de liberdade tem como eixo da questão a aflição do homem no mundo e
sua busca por uma identidade diante da fragilidade das relações humanas. Bauman
classifica essa fragilidade como “Fase Líquida da Modernidade” e, para Gustavo
Dessal, a Fase Líquida atribui conceitos que são pertinentes e modificam estruturas
e criam novos paradigmas. Em O Retorno
do Pêndulo, em cada escrito intercalado, pode-se mensurar o respeito que um
escritor tem pelo pensamento do outro. E mais ainda, o relevo dado às palavras
pelo saber do outro (nessa conversa incomum) se complementa pela sutileza de um
saber que comunga no olhar lúcido de cada um ao refletir as questões de relação
e de fragilidade do homem no mundo. Dentro de um ritmo oscilante de
conhecimento científico a sociologia alia-se à psicanálise como critério de suporte
às análises das questões sociais e de comportamento.
A temática desses escritos exerce sobre nós uma sedução
singular: cada escrito dentro de seu estilo e teoria própria resume um universo
de mudanças que nos convida a refletir
sobre a contemporaneidade. Os dois escritores dominaram o saber analista (em áreas
similares, porém complementares) ao intervirem nas questões psíquicas e sociais
da humanidade representadas como sintoma: ambos os autores souberam manifestar seus
conhecimentos através da admiração e respeito nesse percurso de tratamento durante
a correspondência. Uma pequena demonstração dessa troca respeitosa nas palavras
de Gustavo Dessal dirigidas a Zygmunt
Bauman. Assim, afirma Dessal:
Sua escrita
enlaça o rigor do ensaio e a enunciação poética, e a soma desses dois fatores
permite abrigar o sofrimento dos condenados do sistema, devolver a dignidade
aos restos do discurso, recordar-nos a existência dos rejeitos de um sistema
cuja engenharia social se baseia no álibi do progresso universal.
Dois autores e um complexo campo
de saberes: de um lado o sociólogo Zigmunt Bauman e do outro o psicanalista
Gustavo Dessal: ambos expressando suas vivências
e conhecimentos a respeito do pensamento
do homem (de hoje) em seu estado de reflexão sobre a existência da vida em
sociedade diante de conflituosas emoções. Esses dois gênios ao transitarem com
fluidez pela doutrina social e psíquica, ancorando-se em conteúdos dos diversos campos
da sociedade, foram capazes de nos introduzir em um saber com suas linguagens
específicas para que possamos compreender
os fenômenos científicos sociais e psicanalíticos. Assim, temos o psicanalista
argentino Gustavo Dessal com seus aprofundamentos sobre a doutrina freudiana
historiando fatos, revelando termos freudianos a cerca dos mitos e dos embates
entre Eros e Tânatos – numa
dialética atravessada de paradoxos,
recheada de desejos que promovem a vida – e na outra ponta, encontramos a veemente ação do sociólogo
polonês Zigmunt Bauman. Nessa dialética encontramos com as palavras no
discurso de Dessal: “ E sem os conceitos
psicanalíticos de inconsciente, pulsão, da lógica do significante e da teoria
do gozo, a sociologia corre o risco de extraviar-se nos atoleiros da
metafísica”.
Desse modo, é importante
ressaltar o que a minha leitura pode extrair das questões abordadas via pensamento discursivo dos dois intelectuais contemporâneos: a
certeza de um convite à releitura. Nesta síntese, espero ter alcançado o clímax
das ideias expostas pelos referidos escritores e que, ao repassá-la a possíveis
leitores, encontre o eco pelo prazer em desvendar o belo que li. Convicta da
complexidade de um texto tão abrangente
e com um aprofundamento textual de duas áreas tão relevantes da história do
conhecimento humano, proponho uma visão reflexiva sobre a realidade do momento
atual.
Penso e reflito minuciosamente sobre
o discurso do “futuro do mundo líquido” uma questão que indica um repensar
criterioso em todas as áreas da sociedade e a subjetividade entranhada nessa
complexidade contemporânea. Zygmunt Bauman e Gustavo Dessal nos ofereceu em
seus escritos a oportunidade de rever tais conceitos sobre uma nova visão de
mundo.
Aos escritores o meu mais profundo
respeito e admiração pelo belíssimo trabalho, onde o eco das palavras de cada um dos autores pode acrescentar
experiência e vivência ao discurso analítico em forma de leitura,
oferecendo-nos um diálogo regido pelo desejo de saber. Aos leitores, ofereço uma indispensável ferramenta: desejo de saber
e interesse, pois, esses serão os indicadores que darão suporte ao deciframento
que o rigor científico exige. O Retorno
do Pêndulo é um convite a adentrar pelos
meandros da sociologia e da psicanálise, revestindo-nos de uma aguçada predisposição
para compreender os conceitos das ciências envolvidas em suas vastas dimensões:
“ pensar complexamente é pensar e aceitar
a contradição, confrontá‑la e
superá-la, sem negá-la e sem querer reduzi-la” (VASCONCELOS, 2008). Esse é o
lugar da observação e da reflexão para se compreender o futuro do mundo
líquido.
Minha análise aponta rever o rumo
com que a fragilidade dos sentimentos humanos acena em relação ao futuro: o futuro do mundo líquido. Nesse contexto, aparentemente subjetivo,
pressinto que há causas objetivas tratadas como fenômenos observados. Assim
sendo, atrevo‑me a dizer que os sentimentos humanos também estarão sobre ameaça
e afetados: a liquidez do amor já é uma
prova de tais acontecimentos pois, também pode diluir-se, desestruturando
castelos fantasiosos erguidos com base
na modernidade dos fatos: sem liga, sem laço, sem química e sem amanhã.
Enfim, minhas convicções não
passam de meras observações transcritas como falácia neste escrito.
Empenhar-se em uma boa leitura com acuidade crítica significa um encontro do prazer e do saber com
o rigor científico – O Retorno do
Pêndulo nos oferecer a chave.