quinta-feira, 20 de maio de 2021

 

 PALAVRA

  Por: Vannda Santana

Revisão: Márcia Vital

 

...uma palavra é sempre mais que uma palavra.

                                                               (Texto bíblico)

 

Novamente a palavra entra em cena e, no instante primeiro, por ela, sou abduzida. Assim é a palavra: uma constelação de sentidos enredada num entrelaçamento semântico inserido no contexto da linguagem. A palavra tem voz e fala no escrito pelo silêncio da coisa dita. Há uma memória semântica que  faz com que a estada de uma palavra em uma frase a infle para sempre com um sentido particular – contextual – de que ela não poderá se livrar (Ouaknin,1996).

Tal como uma rede de formas diversas e de sentidos múltiplos a palavra memoriza  aquele sentido naquele contexto e para sempre estará memorizado, amplia e abre suas dimensões de funcionamento para uma intertextualidade mais vasta: a palavra é acontecimento na singularidade de sua aparição, aferindo  expansão em ondas. Assim, a palavra toma para si a tonalidade das outras palavras com total riqueza fônica, para formar (um verdadeiro jogo) de infinitos sentidos de linguagem.

Diante de tamanho encantamento pela palavra e de suas infinitas formas de dizer, murmura em minhas ideias o enunciado de um texto e a intersubjetividade do diálogo que se oferece à interpretação. Pode até parecer que é bem mais que um encantamento, sim, é isto. Mas há um ponto fundamental à  interpretação de um texto: ler é compreender o que se esconde nas entrelinhas do pensamento escrito – e é interpretar – sem destruir a mensagem definida no contexto do campo da linguagem. Estes são os elementos necessários para abrir o diálogo.

A palavra reside no diálogo. A palavra habita no pensamento textual e vive em expansão e quer “nascer”, quer vir à tona, mas a ideia rejeita, não acata a dinâmica da mão que  a escreve –  e entre  o pensar e o agir  o texto escrito não é mais o texto pensado – é uma contradição de realidade com o objeto idealizado que se faz plasmar na folha em branco. A criatividade transita nesse coexistir, nesse limiar da consciência e anuncia-se  na contramão daquilo que o pensamento teve por objetivo em registrar mas a mão não quis escrever. Quase sempre, há três poemas:  um apenas imaginado, outro  escrito e um outro lido.  E a palavra desse instante nascida deveras, tem significado no semear de sentidos por fertilizar palavras.

A paixão por palavras toma meu corpo inteiro e invade todo o  meu ser. Desse encanto, surge um viajar essencial por leituras e “letras” descortinando novas palavras que são como asas de liberdade imaginária.

A palavra tem o poder de uma “senha” – e abre a porta de um vazio desconhecido (de si mesmo) para atuar como agente de renúncia desse grau zero de significações. O grau zero do sentido não é nada além de um momento entre a des-significação e a re-significação. Ele é uma tentativa de fazer com que a significação fracasse e, ao mesmo tempo, de expor o próprio fundamento da significância. (Ouaknin, p. 164)

Ao concluir este artigo, senti uma enorme necessidade em  refazer o caminho de volta, relendo a estreita relação do texto escrito com o desejo antes imaginado. Pois é, alguma coisa havia se perdido pelas entranhas do pensamento. A primeira ideia de escrever este artigo sobre palavras, eu não sei em que labirinto psíquico ela se perdeu, pensei um projeto e tenho um outro texto com sentidos inauditos. Entretanto, por algum motivo as palavras seguiram em silêncio e, pelo mesmo critério, elas atravessam a essência do texto e indicam um novo contexto neste escrito como artefato do dizer. Eis aqui as Palavras como objeto do discurso: (...) o sentido pode sempre ser outro, ou ainda, que aquilo que é o mais importante nunca se diz; todos esses modos de existir dos sentidos e do silêncio nos indicam  que este é fundante (Orlandi, 2007). E assim os sentidos inaudíveis no ato de escrever, encontram eco sobretudo, na forma de relação que a leitura terá com o leitor.

Eis aqui o instante deste diálogo. Diálogo de ex-istência e tempo, segundo Winnicott, para expressar ao leitor que tem sido a (fonte de minha interlocução) para exercer a leitura e ter o domínio da linguagem para então viver grandes acontecimentos.

Boas leituras!